Viver

Chegaste, de mansinho, sem dizeres quem eras. Aos poucos, despertaste-me do torpor em que me encontrava. Não, não estava adormecida, não tinha desistido de viver, tinha desistido da dor. Podemos alguma vez desistir da dor?
Chegaste, intempestuoso e intenso, varreste a minha paz aparente, atiraste-me para um turbilhão de emoções. Eu, que tinha aprendido a deixar de sentir. Despertaste os meus sentidos, um a um, como se tivesse estado sempre assim, alerta, pronta para te receber. Não estava. Não estava pronta para voar tão alto. Não queria abrir as asas. No fundo, não queria abrir o coração, não queria que ficasse exposto novamente à dor, à angústia de não voltar a ter o que me deste. Não estava pronta para cair estatelada no chão e partir as asas. O que seria de mim, depois?
Ainda assim, chegaste como um destino que se cumpre, como um cofre que se abre, foste a fonte da minha alegria e do meu sofrimento, da minha sede e do meu vício de beber mais e mais. Até que partiste. Tudo tem um fim para voltar a ter um princípio. Tudo o que é maravilhoso e belo carrega brutalidade e escuridão. Não existiria se não fosse assim. Mas, sabes, valeu a pena. Antes sentir desta maneira intempestuosa do que não sentir nada. Chama-se viver.

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